Personagem crucial no desfecho do caso Griselda, narrado na minissérie homônima da Netflix, a detetive June Hawkins está viva e participou do desenvolvimento da história. Aos 73 anos, casada com o policial Al Singleton (vivido na atração por Carter MacIntyre), que a ajudou nessa investigação, June conversou com a atriz que a interpreta em Griselda e compartilhou detalhes sobre como foi combater o narcotráfico na Miami de 50 anos atrás.
Esse detalhe é curioso porque geralmente, em tramas desse tipo, baseada em fatos, a escolha é por reunir diferentes tipos de policiais reais em uma única personagem, pois dessa forma se tem mais liberdade criativa. Contudo, a raridade da situação, de ter uma pessoa viva e testemunha de todo o caso, não poderia ser desperdiçada. O destaque dado a uma personagem inteira e única é merecido.
No apogeu da chamada Guerra da Cocaína em Miami, durante os anos 1970, June Hawkins era uma das primeiras mulheres polícias da cidade da Flórida. Aquilo que o público vê na minissérie, ela sofrendo todo tipo de assédio, moral e sexual, dentro do recinto policial realmente aconteceu.
“Naquela época, você simplesmente não dava muita importância a algumas das provocações, como a questão do ar condicionado e o enrijecimento dos mamilos ou qualquer coisa do tipo”, disse em entrevista para a própria Netflix. “Eu sabia que eles [detetives homens] estavam me testando e eu estava preparada para aquilo.”
Ela sofreu rejeição na dinâmica do trabalho, sendo designada para uma função fora da ação das ruas, de fato. “Me colocaram numa sala com um monte de nomes, fotografias e informações e disseram: ‘Dê algum sentido a isso e vamos descobrir quem está cometendo todos esses assassinatos, tiroteios e assim por diante.’”
Juliana Aidén Martinez, que vive June em Griselda, passou horas conversando com a ex-detetive enquanto fazia pesquisa para o papel. A atriz tinha uma conexão natural com June, por ambas terem crescido em uma comunidade predominantemente cubana, em Miami. Isso ajudou na conexão.
“Quando ela era detetive”, contou Juliana falando de June. “Miami era a capital de homicídios nos Estados Unidos. “Por ser cubana-americana, ela compreendia a autenticidade cultural e os fatores acerca daquilo, como saber nutrir uma relação com testemunhas na base da conversa.”
Juliana chega a traçar paralelos entre a vida de June e Griselda, por ambas se firmarem como mulheres assertivas e dominantes em um ambiente masculinizado. “Os homens não conseguiam vê-las como algo além da esfera doméstica a que estavam tão habituados”, comentou. “Elas fizeram uso do elemento surpresa em seu próprio benefício, provando ser resilientes e donas de grande desenvoltura.”
Encontro entre June e Griselda
A cena mostrada na minissérie, de June encontrando Griselda na prisão, é uma adaptação do que aconteceu na realidade. “Eu só encontrei ela uma única vez”, revelou a ex-detetive.
“Naquela ocasião, eu já tinha saído da divisão de homicídios, estava trabalhando com inteligência criminal em um setor diferente. Alan [Singleton, o detetive de Miami que se uniu a June no caso Griselda Blanco] me ligou e disse: ‘Ei, estou com Griselda aqui.’”
“Então”, continuou. “Eu desci as escadas e lá estava ela sentada à mesa parecendo uma avó. Eu não interagi pessoalmente com ela, apenas a observei. E pensei: ‘Poxa, ela parece tão pequena’ Na minha visão, ela não parecia aquela grande mulher durona que presumimos que seria. Ela estava simplesmente diminuída em todos os sentidos. Velha, com aparência cansada, ressentida”.
João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br
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