A Netflix começou 2023 com uma trama que caiu no gosto do povão. A minissérie Caleidoscópio, lançada no primeiro dia do ano, narra a história de um roubo espetacular, acompanhando os passos de criminosos que planejam abrir o cofre mais seguro do mundo. A atração é levemente inspirada em fatos reais, mas nada relacionado ao roubo em si.
Eric Garcia, criador de Caleidoscópio, pegou como base algo que aconteceu depois do furacão Sandy, ciclone tropical que arrasou o caribe e a Costa Leste dos Estados Unidos, em 2012, culminando em prejuízos históricos para as nações atingidas pela tempestade. Uma empresa americana de serviços financeiros quase levou a pior, vendo literalmente bilhões de dólares sendo encharcados pelas águas.
Quando o furacão se dissipou, a firma DTCC (Depository Trust & Clearing Corporation) notou um desfalque gigantesco no depósito localizado no subsolo de Nova York, uma das cidades mais afetadas pelo Sandy. O cofre estava 18 metros abaixo do nível da rua.
A inundação ensopou parte dos 1,7 milhão de certificados financeiros arquivados, ligados a grandes empresas de Wall Street, o coração econômico da Grande Maçã. A cifra do estrago? US$ 70 bilhões de títulos (bonds) não registrados.
Então, Garcia teve uma ideia: e se esses títulos, na verdade, sumissem? E se alguém usasse o furacão como nuvem de fumaça para cometer um assalto?
No linguajar financeiro brasileiro, os tais bonds são chamados de debêntures. Um debênture nada mais é do que um título de crédito ao portador que representa uma dívida, a juros, garantida pelo patrimônio de quem emite.
Esses títulos não registrados, justamente por esse detalhe, podem ser usados para qualquer coisa e por qualquer pessoa, caso caiam em mãos erradas (por isso precisam ser bem guardados). Na legalidade, os títulos não registrados são usados para resgatar um pagamento de juros.
O incrível da história real é que 99,9% dos certificados molhados pela enchente foram recuperados; algo inacreditável, mas aconteceu. O resgate completo durou seis meses. Foi ativada uma verdadeira operação cirúrgica, de auditoria até processo químico de secagem dos títulos (que são papéis). Após isso tudo, os bonds ganharam selo de autenticidade e mantiveram o valor.
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João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br