Sem exagero, os quatro cantos da Terra vão parar a partir de domingo (20) por causa da Copa do Mundo de futebol, o maior de todos os eventos esportivos. Contudo, enquanto se celebra a festa dos povos, a competição esportiva e o entretenimento prazeroso, nunca deve ser esquecido o que está por trás do certame: a Fifa e o jogo sujo dela para organizar um torneio desse porte. Uma nova série do Prime Video ajuda a lembrar disso.
Disponível desde o último dia 4, o Jogo da Corrupção é a atração ideal para esquentar o clima da Copa do Mundo. Mas sem oba-oba utópico. Ali está retratado como a Fifa deixou de ser uma entidade burocrática e quadrada para virar um órgão multimilionário e controlador do principal esporte do mundo, uma verdadeira máquina de fazer (e roubar) dinheiro.
Jogo da Corrupção é a segunda temporada de El Presidente, série indicada ao Emmy Internacional que apresentou a podridão da organização futebolística na América do Sul, com eventos contados pelo ponto de vista de Sergio Jadue (Andrés Parra), dirigente chileno envolvido em tudo que é maracutaia deste lado do hemisfério.
Com uma narração impagável e absurdamente hilária, Sergio Jadue volta para a atual leva. Criou-se uma metalinguagem em que o streaming da Amazon contrata o cartola para narrar a como o brasileiro João Havelange entrou na Fifa e transformou o futebol de maneira definitiva.
Algumas cenas são tão chocantes que é inevitável questionar se foi daquele jeito mesmo que ocorreu, por ser coisas tão deslavadas. O narrador Jadue brinca com os tais exageros da trama: “Juro que não tenho tanta imaginação. Se aconteceu exatamente assim? Foi mais ou menos assim, mas aconteceu.”
A raiz podre da Fifa
Jogo da Corrupção mostra que a Fifa nunca deixou de ser podre, está na raiz. Antes de João Havelange e companhia, a Associação estava longe de ser transparente.
Acontece que com João Havelange, interpretado magicamente pelo argentino Albano Jerónimo, elevou-se para a enésima potência a tática do “rouba, mas faz” ou do “os fins justificam os meios”. Custasse o que custasse, ele estava determinado a fazer da Copa do Mundo uma vitrine publicitária e um espetáculo midiático sem igual. E conseguiu.
A origem de tudo está nos anos 1970. Então dirigente da CBD (a atual CBF – Confederação Brasileira de Futebol), Havelange chefiou a delegação que deu o terceiro título mundial para o Brasil. O ex-nadador olímpico passou a traçar voos mais altos, mirando a presidência da Fifa.
Havia uma grande barreira a ser derrubada. O status quo da Fifa não permitia a influência de “colônias” no tocante à administração do futebol. Só europeus sentavam, literalmente, na mesa principal. Havelange se mostrou disposto a romper com essa círculo viciante.
Ele obteve sucesso em 1974, com o apoio decisivo de países africanos, ganhando a eleição apertada de presidente da Fifa. O carioca ficou no cargo até 1998, colocando o futebol (e principalmente a Copa do Mundo) em outro patamar.
A série Jogo da Corrupção revela que o caminho para tanto foi de muitas tramoias, acordos ilícitos, deturpação da ética… uma corrupção pura. De fora, o público apenas via a festa nas arquibancadas, a felicidade do país-sede das Copas e o show dos atletas nos gramados. Entretanto, nos bastidores o jogo não poderia ser mais sujo. E isso não deve ser varrido para debaixo do tapete.
João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br