As tão populares séries policiais da TV americana nunca mais foram as mesmas pós-George Floyd, homem preto morto asfixiado por um policial branco, em maio de 2020, nos Estados Unidos. Dramas como Chicago P.D. e FBI tiveram de tocar no assunto da reforma policial, mudança no jeito de abordar e tratar suspeitos. A atração East New York – Uma Nova Lei surgiu para ser o símbolo dessa alteração de rumo com trama explicitamente progressista. Não deu certo.
Lançada recentemente pela HBO Max, streaming da Warner Bros. Discovery, East New York foi criada para injetar um ponto de vista fresco no gênero drama policial, disparado o mais popular entre os americanos e de igual fama ao redor do mundo (na temporada 2022-2023, três das séries mais vistas nos EUA foram dramas policiais: NCIS, FBI e Blue Bloods).
Como diz o título da produção, East New York é ambientada na zona leste da cidade de Nova York, em delegacia localizada no bairro do Brooklyn, quebrada barra pesada. O ponto de partida da narrativa é a chegada de Regina Haywood (Amanda Warren) assumindo a chefia da 74ª delegacia da polícia de Nova York (NYPD).
A inspetora preta não perde tempo ao apresentar novas ideias para melhorar a percepção que a população (principalmente a mais pobre e menos favorecida) tem da polícia. Regina abraça a missão de ir além do dever de servir e proteger a comunidade, mas também fazendo parte dela.
Cada peça movimentada na série visa passar uma nova imagem da polícia. É a tentativa de se dissociar de cenas comuns nesse gênero, como o policial branco herói com pegada de justiceiro, prendendo na maioria das vezes jovens pretos e passando por cima da ética e das leis, desde que a finalidade da tarefa seja justificada.
O ponto fraco de East New York foi querer fazer isso de forma muito escancarada, panfletária. Não se tem ali uma boa narrativa policial que, porventura, seja progressista e contra o sistema. Parece tudo muito forçado, sem naturalidade e longe da realidade.
Regina leva ao pé da letra o objetivo de aproximar seus subordinados da população do bairro. Um apartamento em conjunto residencial carente é oferecido para alguém da corporação que queria morar entre as pessoas mais simples, tentando criar vínculo e torcendo para romper a animosidade. Quem aceita a tarefa é uma policial… branca (pobre, mas branca).
East New York assumiu compromisso bem espinhoso. Contudo, a série que se propõe a tanto precisa ser menos engessada e declaradamente militante. É possível, e necessário até, apresentar narrativas de uma nova polícia. Detalhe é que conto de fadas não colam.
Ainda não houve série tipo A Escuta (The Wire, 2002-2008). Quase duas décadas antes da fatalidade ocorrida com George Floyd, o excelente drama da HBO foi cru e cirúrgico ao expor os podres da polícia, deixando de lado a hipocrisia. Mostrou-se a truculência do emaranhado sistema vigente, sem solução fácil aparente.
É verdade que, na maioria dos casos, os dramas policiais exageram na exaltação dos tiras, agentes e detetives, com a franquia Law & Order sendo o exemplo mais nítido disso. Para haver equilíbrio, seria interessante ter uma nova série delatando a podridão do sistema e apontando soluções realistas. Não foi o caso de East New York
Por que East New York foi cancelada?
Drama policial que começou bem a temporada de estreia, East New York não passou dessa marca. A rede CBS optou por cancelar a atração, mesmo apresentando bons números de audiência e perdendo poucos telespectadores, quase nada, entre a estreia e o episódio final.
Dois fatores colaboraram com o cancelamento. Primeiro foi o fato de a série não ser uma produção caseira, dos estúdios da CBS. East New York saiu da produtora Warner Bros. Television. Sendo produto de terceiro, o custo de manutenção no ar é mais caro, por causa do pagamento de licenças e afins.
Outra questão foi a disputa com Swat por uma única vaga no horário nobre. Colocando na balança, a CBS preferiu manter Swat no ar, revertendo cancelamento, e acabar com East New York.
Swat tem protagonista preto, Shemar Moore, é drama policial também e já está estabelecido no mercado, indo para a sétima temporada. A base de fãs é mais sólida e a comercialização internacional é rentável; e tem participação dos estúdios da CBS na produção, em parceria com a Sony.
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João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br