Realmente, a alta sociedade britânica retratada em Bridgerton era fofoqueira, no começo dos anos 1800? As pessoas se vestiam daquele jeito mesmo? Por mais que seja uma obra explicitamente de ficção, inserindo recursos e pensamentos modernos em um drama de época, a série pomposa da Netflix apresenta certos aspectos que são factuais sobre a Regência Britânica, período que serve de pano de fundo para a narrativa.
É o que aponta a historiadora Lizzie Rogers, professora britânica especializada nesse recorte da história do Reino Unido. Em entrevista ao site People, ela destacou que Bridgerton acerta em muitas coisas, como nos quesitos decoração de set e figurino. Claro que outras questões são criações dos produtores e roteiristas em prol da dramaticidade.
A chamada Regência Britânica durou, oficialmente, entre 1811 e 1820. Ela foi implementada após o diagnóstico da loucura do Rei Jorge III (encenação vista na série Rainha Charlotte), incapacitado de comandar o reino. Quem assumiu o trono foi o príncipe Jorge IV, assumindo o posto de regente até a morte do pai. O regente é um chefe de governo durante a menoridade ou a indisponibilidade de um soberano.
O que é real e ficção em Bridgerton
Os Bridgertons, coleção de livros da autora Julia Quinn, se passa entre 1813 e 1827. A série aproveita dessa época para esbanjar figurinos ricos e espalhafatosos, típicos daquele tempo. A historiadora Lizzie carimba como verdadeiramente precisas as escolhas das vestimentas dos personagens da elite que permeiam a atração.
Ela destaca, contudo, que as mulheres da Regência usavam muitos gorros, chapéus e afins quando saíam de casa. A equipe de Bridgerton optou por não copiar, a todo instante, esse estilo, até para não esconder os rostos das personagens, facilitando o trabalho da gravação e tornando a experiência visual mais livre. De tabela, pode usar e abusar de penteados diversos.
Lizzie aproveitou para falar de como a série usa o penteado como símbolo de algo que acontecia naquele período. “É feito um bom trabalho separando as mulheres mais jovens, que não estão exatamente transitando na sociedade, com os cabelos soltos, das mulheres que estão na sociedade, com os cabelos presos”, registrou.
Curiosamente, a professora observa que Bridgerton segura a onda em algo que faz muito bem, que é a decoração dos cenários. O público vê um luxo só na casa dos nobres, ainda mais dos Bridgertons. Porém, a elite de então não poupava nada quando o assunto era ostentar poder e riqueza no lar. “Era muito importante mostrar para os outros sua condição financeira e posição social”, explicou.
Os bailes de debutantes e outras festas estão nos conformes da Regência, confirmou a historiadora: “Nós temos uma noção daquilo graças às cenas de Bridgerton”. Claro que as canções eram diferentes das que ouvimos na série, já que a escolha do departamento musical da atração foi adaptar composições de artistas modernos, de Taylor Swift a Ariana Grande, em estilo clássico.
E, sim, a fofoca rolava solta na high society. Existiam colunas de fofocas sobre esse mundinho, com uma distinção. “Os fofoqueiros não nomeavam as pessoas”, disse Lizzie. “Os comentários eram feitos de uma forma que as pessoas sabiam de quem estava se falando, mas não escreviam isso diretamente porque resultaria em difamação, conforme a lei.”
O progressismo visto em Bridgerton é certamente exagerado, apesar de ter um pingo de verdade. Entra em campo a licença poética para inserir temas como diversidade e feminismo em uma época na qual não se via as coisas por esse prisma. Pessoas brancas e não-brancas até conviviam entre si, mas não do jeito que a série mostra, sem um contraste grande no modo de agir.
João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br