
Série da Netflix líder de audiência na última semana, Desobedientes (Wayward) segue os passos de um policial, chamado Alex (interpretado por Mae Martin), que muda-se para uma nova cidade com a mulher grávida, Laura (Sarah Gadon), e logo se vê envolvido em estranhos acontecimentos. A identidade sexual dele, que não reflete o perfil de Mae, gera curiosidade por parte do público.
Na trama de Desobedientes, Alex é um homem trans. Ou seja, nasceu com o sexo biológico feminino, mas se identifica como homem. O personagem passou por transformações corporais para perder traços femininos e adquirir características masculinas. A série trata disso de diversas formas, como em uma cena na qual sua mulher faz um comentário sobre a barba de Alex crescendo.
Mae Martin, por sua vez, é uma pessoa não binária, alguém que não se identifica exclusivamente como homem nem como mulher; fez essa revelação pública em 2021.
Compreendendo o interesse do público pela sexualidade e gênero de Alex, Mae esclareceu que o fato de o protagonista da trama ser trans não é, de forma alguma, o ponto central da história, nem mesmo do personagem.
“É importante vermos personagens queer em que isso não seja o aspecto definidor”, disse, em entrevista ao jornal Los Angeles Times. “Isso provavelmente espelha a vida de muitas pessoas trans… em que a identidade não é uma parte significativa do dia a dia.”
Um aspecto interessante da narrativa de Desobedientes é como a orientação de Alex aparece em sua busca por uma hipermasculinidade heteronormativa e desejo de liderar uma família nuclear. Ele assume o papel masculino na relação com Laura, protegendo-a a qualquer custo nesse ideal de nutrir uma família tradicional
Para Mae, Alex entra em conflito, principalmente no final da história, com sua própria bússola moral e também com o desejo intenso de aceitação social padrão que sempre almejou.
Atualmente, Mae Martin é uma das poucas pessoas da comunidade LGBTQIA+ em Hollywood com poder de criar e ser showrunner dos próprios projetos (como fez em Desobedientes).
Embora diga tentar não pensar muito em sua visibilidade pública ao criar suas obras, Mae admitiu que é assustador ser artista queer em um momento no qual Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, e setores conservadores vêm atacando ativamente e revertendo proteções legais da comunidade queer, especialmente de pessoas trans e não binárias.
Na sua visão, vale muito apresentar a experiência trans como uma pequena parte da experiência humana, no geral. Assim, quanto mais for possível destacar personagens diversos, que sejam falhos, engraçados, excêntricos e que erram, que tenham relacionamentos e tudo mais, é uma coisa útil a ser feita. •

João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br