Estreou no Globoplay a minissérie Mulheres do Movimento, baseada na história real que ajudou a dar início à luta social pelos direitos civis e raciais nos Estados Unidos, na década de 1950. O ponto-chave do caso é a morte brutal do adolescente preto Emmett Till (Cedric Joe), de 14 anos, que foi linchado e torturado por homens racistas. O rosto dele ficou desfigurado, imagem que foi publicada em uma revista com a autorização da mãe, Mamie Till-Mobley (Adrienne Warren). Não havia dúvida de que a série, para ter impacto, precisava mostrar o cadáver irreconhecível.
Intitulado no original de Women of the Movement, o drama Mulheres do Movimento foi exibido no começo deste ano na TV americana, pela rede ABC. Por ser uma emissora de sinal aberto, era necessário tomar vários cuidados e obter diversas aprovações para mostrar uma cena tão explicitamente violenta.
O momento se deu no final do segundo episódio e chocou os telespectadores americanos, virando assunto em todos os lugares no dia seguinte da exibição.
Durante as férias de verão de 1955, Emmett deixou a cidade de Chicago, onde morava, para passar uns dias com parentes em uma cidade do Mississippi, Estado localizado no sul dos EUA. Por lá, a segregação racial imperava e a tensão era altíssima nas interações sociais entre brancos e pretos.
Emmett estava com amigos em uma loja, tipo mercadinho, cuja operadora de caixa era uma mulher branca, casada. Ele foi acusado de assobiar para ela, quebrando aí um código de conduta no Estado extremamente racista. O marido da moça, com ajuda de outros homens, sequestrou Emmett.
A mãe do garoto fez de tudo para encontrá-lo com vida, busca que ganhou repercussão na mídia da época. Mas o destino final foi outro. Ela foi chamada para reconhecer um corpo retirado de um rio: era Emmett. A face dele estava toda desfigurada. Mamie chamou um repórter da revista Jet para tirar uma foto do filho e “mostrar para o mundo o que fizeram com o meu garoto”, justificou.
Cena fundamental
Marissa Jo Cerar, criadora de Mulheres do Movimento, tratou a cena cortante como fundamental. Na série, enquanto Mamie toca o corpo de Emmett, a mente dela viaja ao passado, quando o segurava ainda bebê e o acariciava. Até chegar o instante em que ela encara o rosto deformado do filho. “Esse é o ponto de virada da história, o início de tudo”, disse em entrevista ao jornal Los Angeles Times.
Vice-presidente de desenvolvimento e conteúdo estratégico da ABC, a executiva Simran Sethi falou ao jornal sobre o papel da emissora nesse processo: “Para nós, a história [da minissérie] é muito importante e deveria ser contada na íntegra. Como uma rede de TV aberta, temos responsabilidade com o público. O projeto aborda um momento de cortar o coração, mas tínhamos que honrar o legado de Mamie e mostrar a verdade para as pessoas.”
Foi criado um boneco com o molde exato do corpo do ator Cedric Joe, intérprete de Emmett, para aparecer na cena em questão. “Queríamos fazer algo o mais realista possível, dentro dos limites do que se pode mostrar em uma série de TV aberta”, explicou Marissa.
“A gente precisava ver o que Mamie viu”, continuou. “Caso contrário, a história não faria sentido. A revista Jet imprimiu as imagens. O mundo reagiu às fotos. Queríamos que nosso público testemunhasse o que Mamie viu. Ela é nosso guia para entender aquele horror que ela olhou com os próprios olhos”.
João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br
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