Melhor do que muito documentário sobre a intensa guerra cultural tão presente no ambiente escolar, a série O Professor usa a comédia na abordagem de temas polêmicos, como questões de gênero e releitura de eventos históricos. Ambientada em uma escola de ensino médio nos Estados Unidos, a trama estreia no Brasil na quarta-feira (27), no Disney+, com todos os oito episódios.
O que acontece naquele cenário é de fácil assimilação ao público brasileiro, principalmente para quem tem conhecimento de causa sobre como estudantes e professores estão na batalha da mesma polarização gritante que tomou conta da sociedade.
Um ponto forte de O Professor é não ser uma série panfletária, que toma partido e levanta uma bandeira. Os assuntos dissecados ao longo dos capítulos são naturais, daqueles que brotam verdadeiramente no cotidiano de qualquer escola de ensino médico na atualidade. E a trama abre espaço para todo tipo de perspectiva, seja do professor (interpretação mais madura) ou dos alunos (adolescentes, ainda verdes).
A comédia é precisa ao explorar condutas que cercam temas considerados wokes (politizados) ou antiwokes. Dito isso, é importante que o telespectador brasileiro entenda um contexto da narrativa que é particular dos EUA.
O cenário da história é o subúrbio da cidade de Austin, Estado do Texas. O local é um pontinho progressista (esquerda, no espectro político americano) completamente cercado pelo conservadorismo, visão que impera no Texas, lugar que tradicionalmente é reduto da direita. Em Austin está a Universidade do Texas, uma das maiores e melhores instituições de ensino superior do país.
Esse choque progressista-conservador é reforçado em várias dinâmicas da atração, como a do pontapé inicial da história. O personagem titular é Evan Marquez (Brian Jordan Alvarez), que dá aulas de inglês na Morrison-Hensley High School (ensino médio). Ele se encontra em uma enrascada por causa de investigação sobre uma postura rotulada de imprópria: o professor gay beijou seu namorado na frente dos alunos e foi alvo de denúncia de uma mãe por causa disso.
O diretor da escola, Grant Moretti (Enrico Colantoni), não quer saber de confusão. Ele até entende que, num mundo ideal, Evan não deveria encarar constrangimentos desse porte, mas as circunstâncias são outras.
Os estudantes dele ficam sabendo disso e, provando o humor afiado da série, um aluno sugere que ele se defenda usando o argumento da discriminação, por ser um hispânico gay. Outro colega rebate: “Gay não conta mais, e ele parece um cara branco hétero.”
Com muita perspicácia, O Professor transita com total tranquilidade sobre os assuntos mais espinhosos, sem perder o bom humor. Como quando estudantes pedem que um professor explique o conceito de não binário (só para gravar alguma fala problemática e postar na internet). Ou na ocasião de homens se vestindo de mulheres devido a uma tradição da escola; há quem ache isso ofensivo.
Episódio após episódio, a comédia O Professor não foge de temas sensíveis que afetam a juventude de hoje, de identidade sexual a bullying, sem ser demagoga. A narrativa encontrou a linha fina e não descamba para a outra ponta, a de debochar agressivamente de situações críticas e graves. •
João da Paz é editor-chefe do site Diário de Séries. Jornalista pós-graduado e showrunner, trabalha na cobertura jornalística especializada em séries desde 2013. Clique aqui e leia todos os textos de João da Paz – email: contato@diariodeseries.com.br